Para melhorar o tráfego na Av. Rangel Pestana (1948)

Imponente viaduto de concreto transporá o leito da ferrovia

Terá a largura da artéria e 220 metros de comprimento, sendo de suave elevação – Apresentar-se-á num bloco de grande suntuosidade, sem causar a menor dificuldade de ordem técnica

O sr. Pedro de Andrade Lemos, chefe dos Serviços de Eletrificação dos Subúrbios de S. Paulo projetou uma forma de solução para o tradicional problema do Brás, as porteiras da avenida Rangel Pestana.

Na tarde de ontem o prefeito Paulo Lauro reuniu em seu gabinete os representantes da imprensa da Capital a fim de demonstrar a maneira de resolver o grave problema de trânsito e a ligação entre o Brás e o centro da cidade de S. Paulo. Exibindo mapas e fotografias da “maquette” do projeto que mandara realizar, esclareceu que será ele prontamente enviado à Câmara Municipal, como medida preliminar para a sua execução.

UM VIADUTO DE CONCRETO

Não quis os sr. Paulo Lauro que S. Paulo assistisse mais uma passagem de aniversário sem que tivesse sido encontrada uma fórmula definitiva para esse tão velho e grave problema. Dessa forma apressou a elaboração do projeto, agora concluído. S. Paulo, cidade de viadutos e das largas e novas avenidas, terá em breve mais um grande viaduto de concreto, que, com rampas em suave elevação, transporá o leito de ferrovia, em toda a largura atual da avenida Rangel Pestana.

Nada menos que 220 metros terá a nova realização arquitetônica, e com a largura de 30 metros e um alinhamento a outro. O Viaduto “Adhemar de Barros”, pois esse será o seu nome de batismo, terá três vãos livres, sendo um central, de 22 metros de largura e seis de altura, abrangendo todo o espaço presentemente utilizado pela Estrada Santos-Jundiaí, e dois vãos de 17 metros de largura por 8 de altura, para o trânsito das ruas laterais e paralelas ao leito da estrada.

NENHUMA DIFICULDADE DE ORDEM TÉCNICA

Em seguida o governador da cidade passou a examinar a questão de problemas de ordem técnica que por ventura deveriam surgir. Explicou pormenorizadamente à reportagem, que a forma de solução para o problema não apresenta senão vantagens: não dificultará nem impedirá o sistema de redes de força elétrica dos trens e bondes; não modificará o atual sistema de transportes naquela artéria, pois os veículos poderão transpor com facilidade as rampas suaves, sem interrupção do tráfego; nenhum problema surgirá no que diz respeito ao sistema de águas pluviais e esgotos, e isso em virtude de poder ser o viaduto aterrado nas duas terças partes iniciais, a leste e oeste, dado o seu declive de 7,5 por cento, apenas; seus três vãos livres de abertura mínima de utilização exigem estrutura simples e permitir a construção das dependências laterais em alvenaria de tijolos e colunas de concreto, independentes do sistema do conjunto.

MAIS SUNTUOSIDADE E BELEZA AO LOCAL

Prosseguindo na sua exposição, disse o sr. Paulo Lauro que o Viaduto “Adhemar de Barros”, além da sua grande utilidade, concorrerá para dar maior suntuosidade e beleza ao local, pois, com as desapropriações das faixas laterais, poderá ser visto em conjunto e em toda a sua grandeza, como acontece com o Viaduto do Chá. Os terrações das dependências laterais do viaduto constituirão um excelente mirante sobre a zona baixa da cidade.

Falando das vantagens da utilização do Viaduto “Adhemar de Barros”, salientou o prefeito da Capital que as faixas laterais de 30 metros, ocupando terrenos a serem desapropriados, viriam a facilitar o acesso de veículos à Estação Roosevelt, assim como o retorno de veículos dentro das leis do trânsito dirigido. A largura do viaduto, igual à da Avenida Rangel Pestana, não apresentaria congestionamento, dando livre transposição aos veículos e pedestres.

Além de todas as suas vantagens, acrescentou o sr. Paulo Lauro, há a possibilidade da instalação de um posto de Radio Patrulha e Assistência Pública na parte inferior, para atender às necessidades da zona além-ferrovia, de uma agência de Correios e Telégrafos, agência de informação dos sistemas de transportes estadual e urbano, e instalações sanitárias, amplas e higiênicas.

Diário da Noite, São Paulo, 24 de janeiro de 1948.
Fonte: Hemeroteca Digital Brasileira

Nada de anormal, apenas o tráfego (1947)

Pouca pessoas terão idéia suficiente do nosso tráfego. Pelo menos, à primeira vista, com estas duas fotografias, vão imaginar que se trata de um desastre. Mas não é desastre nenhum. Isto acontece em S. Paulo.

As fotografias foram tiradas num dia qualquer da semana, numa esquina vulgar da cidade, a esquina das avenidas Ipiranga e S. João, e retrataram um aspecto comum da desordem do tráfego, que ocasiona congestionamentos desesperadores, e uma barulheiras de businas ainda mais desesperante.

São automoveis, bondes, ônibus, caminhões, até a tração animal, bicicletas, tudo num redemoinho danado nas esquinas da cidade. E o paulistano nem suspeita que está testemunhando uma complicação de tal ordem. Quando repara é o que está aí nesses flagrantes: um foi feito ás 11,30 horas, o outro ás 12,08 minutos, sob a luz do meio-dia.

Não está semelhante estado de coisas a exigir uma solução?

Diário da Noite, 17 de fevereiro de 1947.
Fonte: Hemeroteca Digital Brasileira

*A grafia original foi mantida em sua integralidade preservando as regras ortográficas vigentes à época.

A Mãe Preta e o Quarto Centeário

Mãe Preta

Por Quirino da Silva

Agora que se aproximam os festejos do quarto centenário da fundação da cidade, agora que nos preparamos para tudo mostrar ao estrangeiro, acerca das nossas atividades, enfim, tudo que no período de quatro séculos fizemos, ao estrangeiro que por aqui passar, aquele que antes chamávamos de viajante, e hoje, retorcidamente, se tornou turista. A esses, gostaríamos também, se possível, dizer-lhes do nosso reconhecimento a uma das magníficas figuras quem, a princípio, muito contra-gosto se ligaram à nossa história – desde o momento em que o colonizador sentiu a necessidade de para cá canalizar o braço negro, a fim de que o plantio tivesse mesmo incremento; para que o homem branco pudesse dar conta da árdua tarefa que se propôs, de aproveitar a terra – a terra: “em tal maneira é graciosa, que, querendo-a aproveitar, dar-se-á nela tudo…” Como muito bem disse o senhor Pero Vaz Caminha, aquele que fez o registro civil do Brasil.

Trata-se simplesmente da mãe preta, a mãe de todos os filhos: aquela que, carinhosamente, foi mãe dos seus próprios filhos (quando tinha tempo) e mãe, muito mãe, dos filhos que não eram dela.

Mãe Preta, Lucílio de Albuquerque, 1912. Museu de Arte da Bahia, Salvador.

Sejamos brasileiros: não deixemos que os nossos sentimentos de raiz desapareçam neste instante em que pretendemos render homenagem àqueles que à força de inteligencia, de talento e trabalho, muito fizeram e fazem por este Estado.

Chegamos, é verdade, a um ponto bem elevado: chegamos até a nos ombrear com os povos mais civilizados. Há já muito que declaramos, em carta magna, prescindir do braço escravo negro; há muito, é bem verdade, que as naus portuguesas também não mais aproam nas praias africanas; há muito que, dos sombrios e infectos porões dos navios negreiros não saem a se perder na amplidão dos mares os queixumes, os silenciosos e doridos queixumes da queles que ajudaram a fazer à nossa riqueza.

Mãe Preta, Júlio Guerra, 1955. Largo do Paissandú, São Paulo.

Sejamos brasileiros: lembremo-mos que a mãe preta compartilhou sempre das nossas horas amargas, das nossas horas alegres. Homenageemos pois, a mãe preta, porque nela está simbolizada a bondade, a fidelidade, a amizade de uma raça que muito nos ajudou e ajuda.

Ergamos, se possível, um monumento à mãe preta.

Diário da Noite, São Paulo, 14 de fevereiro de 1952.

Fonte: Hemeroteca Digital Brasileira

Está exigindo uma reforma o velho Museu do Ipiranga

Não está em condições de receber visitas, o imponente edifício – Até hoje, não foi dotado de eletricidade

A administração paulista através da Comissão do IV Centenário, já está dando providências no sentido de revestir de brilho os festejos que assinalarão a passagem do quarto século de fundação da cidade de São Paulo. Verbas têm sido votadas nas casas legislativas, inclusive a necessária para a instalação da Comissão que cuidará de orientar as comemorações. Tudo indica, pois, que São Paulo, embora não com a suntuosidade esperada – que se tornaria descabida numa época de economia como a atual – irá festejar, condignamente, o seu quarto centenário.

ESQUECIDO

Ao que parece, porém, dos melhoramentos previstos para as cerimônias cívicas que então serão assinaladas, o Museu do Ipiranga está sendo totalmente esquecido. Entretanto, trata-se de um setor que os responsáveis não deveriam olvidar, por ser tratar de local onde se encontram depositadas verdadeiras jóias não só da história de São Paulo, mas também, do Brasil.

LASTIMAVEL

O estado atual do Museu do Ipiranga – qualquer pessoa o poderá constatar – é deploravelmente lastimavel. Dir-se-ia estar relegado ao mais completo abandono. Ao que parece, a atual administração do Museu luta com a falta de verbas e, consequentemente, ver-se-ia tolhida, na tarefa de cuidar como devia das relíquias que lhe foram confiadas. A exposição das mais interessantes peças da nossa história é desordenada, não obedecendo à técnica de Museu. A etiquetagem é velha e lacônica. muitas peças expostas não possuem sequer etiquetas explicativas ou simplesmente elucidativas. Tem, o visitante, a impressão de que nada se faz no sentido de preservar os objetos históricos da ação do tempo.
Uma simples vista de olhos pela sala de armas confirmará a assertiva. A generalidade dêsses objetos está tomada pela ferrugem e não se nota qualquer demonstração de cuidado para evitar a ação corrosiva.

ABANDONO

Observou a reportagem que no porão do edificio, atualmente em reforma, estão relegados ao abandono verdadeiras reliquias. Vêem-se ali quadros, celas e até ferragens com as quais, na época da escravatura, os fazendeiros prendiam os escravos. Assim, encontram-se amontoados a um canto do porão, correntes, pesos e algemas, documentos vivos de uma época da história. Esse material talvez permitisse a organização de uma “Sala da Abolição”, por exemplo.

Ainda no porão do Museu, onde a reportagem penetrou sem ser pressentida, vêem-se ferragens antigas ali depositadas sem o menor cuidado

IRREGULARIDADES

Embora muita gente o ignore, o edificio do Museu do Ipiranga não é dotado de luz elétrica! Os funcionarios, geralmente, são obrigados a deixar o serviço pouco depois das 16 horas, quando o dia começa a escurecer, pois, dada a falta de luz, o trabalho se torna impossivel.

Para clarear parte do edificio, existem varias claraboias. A principal, colocada bem ao centro do prédio, sobre uma escada de mármore – autêntico mármore de Carrara o mais fino em matéria de mármores – está completamente quebrada. Quando chove, o alvo mármore fica completamente alagado e os funcionários penam para retirar dele a ferrugem desprendida do teto estragado.

Esta é a claraboia central do edifício do Museu do Ipiranga, que não é dotado de energia elétrica. Está com os vidros quebrados, por onde penetra chuva, que vai manchar a alva escada de autêntico mármore de Carrara

Durante a administração anterior, foram construidos varios reservados sanitarios para uso dos visitantes. Atualmente, esses aparelhos sanitarios, embora em bom estado, foram interditados inexplicavelmente, causando, não raro, embaraços a muitas pessoas, especialmente crianças, que visitam o Museu.

PROVIDENCIAS

Do conjunto, ressalta que é deploravel a situação do Museu do Ipiranga, ponto dos mais importantes para a visita do turista, em 1954. Se providencias adequadas não forem tomadas em tempo, ali estará uma fonte de comentarios desairosos sobre a nossa capacidade de avaliar nossas obras históricas.

O Museu do Ipiranga não está em condições de ser visitado agora, quanto mais em 1954, a continuar nesse estado. Aliás, o próprio govêrno, segundo parece, já se apercebeu da situação.

Diário da Noite, São Paulo, 3 de dezembro de 1951.

*A grafia original foi mantida em sua integralidade preservando as regras ortográficas vigentes à época.

Quando São Paulo chegará a ser assim?

O assumpto que tem merecido da imprensa os mais zelosos commentarios tem sido, de um anno para cá, aquelle que se refere á solução do problema de transito na cidade. Com o repentino augmento dos vehiculos em poucos mezes tivemos a opportunidade de assistir a um phenomeno imprevisto: o atravancamento do centro da cidade, que desde logo assumiu proporções asssutadoras e é hoje a chronica dôr de cabeça da nossa Inspectoria de Vehiculos. Longe, porém, de nos entristecermos com o problema, devemos nos alegrar, pois elle é o advento de uma éra de engrandecimento.

Os aspectos nova-yorkinos que ha dez annos nos deixavam perplexos – hoje não mais conseguem emocionar os nossos sentidos. Temol-os por aqui, já em formação promissora, aquelles phantasticos congestionamentos, e tanto esperamos, que já conhamos equalal-os um dia…

A Gazeta, São Paulo, sexta-feira, 20 de dezembro de 1926
Fonte: Hemeroteca Digital Brasileira.

*A grafia original foi mantida em sua integralidade preservando as regras ortográficas vigentes à época.

O fim do mundo… (1926)

Na rua Augusta um bonde espatifou um automovel, por causa dos “nove pontos”…

O lamentavel estado do auto n. 2.258

Positivamente, si continuarmos como vamos, dentro em pouco, em S. Paulo, não mais existirá um homem vivo, mas em compensação, nem um automovel em perfeito estado. Todos os dias temos a registrar mortes e desastres gravissimos, quando não, por lastima, o escangalhar de um carro de luxo, que foi de encontro a um bonde ou a um pedestre sonso, que não sabe o seu lugar e pouca dá pela integridade de um auto de alto preço…

Agora, tambem os bondes deram para espatifar os automoveis. Ante-hontem, foi na rua do Gazometro, e hontem, na rua Augusta.

Por volta das 20 1/2 horas, rebocando a Chevrolet n. 3.317, descia o caminhão Ford n. 2.258, aquella via publica, guiado pelo motorista Nicolino Nogueira. Porque trazia os pharóes do reboque apagados, numa esquina, foi intimado a parar pelo “grillo” Americo Moura. A explicação foi immeditamente dada; os pharóes do reboque se achavam apagados porque o carro estava quebrado, e o Ford que o puxava tinha as suas luzes sufficientemente claras, para evitar qualquer desastre.

Essas explicações todas estavam sendo dadas, quando, subindo a rua Augusta, em desabalada carreira, surgiu o bonde 1.112, da linha “Augusta”, que avançou para o miseravel Ford, atirando com elle e mais o seu reboque, para o meio do passeio, completamente em pedaços.

Foi tão violento o choque, que o estribo do bonde saltou a uma distancia de dez metros!

Felizmente o “chauffeur” e o “grillo”, vendo a velocidade do bonde e sabendo que não podiam salvar os dois vehiculos, trataram de saltar rapidamente para o lado, nada mais soffrendo que um formidavel susto.

O desastrado motorneiro foi preso em flagrante.

A Gazeta, São Paulo, sexta-feira, 17 de dezembro de 1926
Fonte: Hemeroteca Digital Brasileira.

*A grafia original foi mantida em sua integralidade preservando as regras ortográficas vigentes à época.

A Estação da Southern São Paulo Railway vai ou não vai abaixo? (1925)

SANTOS, 27 — Apesar de todo o barulho que se tem feito, a barraca que serve de estação á Southern São Paulo Railway, avenida Anna Costa, continua de pé. É um escarneo, realmente, o que se verifica. Numa das mais movimentadas arterias da cidade, não é natural que tal absurdo se verifique, o que têm interesses ligados á zona servida por aquella estrada.

Como já tivemos opportunidade de referir, a Camara Municipal, por diversas vezes, tem abordado o palpitante assumpto, sendo unanime a condemnação dos srs. vereadores ao [ilegível] barracão, que afeta a avenida Anna Costa. Ha pouco, ainda, o sr. vereador Alfaya propoz que fosse aquella estação demolida, sem mais formalidades, uma vez que a Southern tem desrespeitado diversas intimações da Camara.

No emtanto, nada tem adeantado as providencias tomadas.
A Companhia persiste no seu proposito de não demolir a estação. E lá permanece, para escarneo geral, aquella indecencia.

Não póde haver duas opiniões a respeito do assumpto. A Estação precisa ser demolida, por constituir um aleijão. Além do mais, as pessoas que precisam embarcar para Juquiá e outros logares, em dias de chuva, não tem, siquer, onde se abrigar.

Não póde, pois, persistir tal estado de coisas. É necessário que o barracão seja demolido. A Camara deve fazer cumprir as suas determinações.

A Gazeta, São Paulo, segunda-feira, 27 de julho de 1925
Fonte: Hemeroteca Digital Brasileira.

*A grafia original foi mantida em sua integralidade preservando as regras ortográficas vigentes à época.

Estação da Southern São Paulo Railway em 1925.

Já pensou em um bairro onde a avenida principal é assim? Ele existe.

Fica na Zona Norte. Tem um córrego imundo, ratos que mordem até crianças, uma pedreira que está sempre ameaçando acabar com as casas, quando explode. E não tem escola. É Vila Iara.

A Vila Iara é um bairro que se localiza na Zona Norte da cidade, entre a Freguesia do Ó e Pirituba/Perus, e apesar de já existir há 40 anos e contar com mais de vinte mil habitantes, não possui as mínimas condições de saneamento básico. Nem escola Vila Iara tem. A avenida principal não é pavimentada e os buracos causam inúmeros problemas ao trânsito da região.

A avenida principal não é pavimentada

Um dos moradores mais antigos de Vila Iara é Paulo Fillinto da Silva, que mora na rua São Urbano, conhecedor profundo dos problemas do bairro e que diz:

Em primeiro lugar, nós estamos pleiteando a instalação de uma escola. Essa é uma velha aspiração, desde 1973 estamos pedindo e até agora nenhuma providência foi tomada, por parte das autoridades, para sanar esse sério problema. A escola mais próxima que temos fica na Vila Morro Grande já na Freguesia do Ó, e é distante dois quilômetros daqui. Além disso, nesta escola não existem vagas e muitas crianças em idade escolar ficam sem poder estudar. No ano passado meu filho de sete anos não estudou por falta de vaga. A diretora da escola alega que as classes estão superlotadas

A escola mais próxima está a dois quilômetros e nunca tem vaga

Paulo afirma que todo ano é o mesmo problema. E outro grave problema: o córrego Iara.

Temos aqui o córrego Iara que é uma imundície. Como nós não temos rede de esgotos e nem fossa, pois os terrenos da região estão num baixada, então só nos resta jogar os detritos no córrego. Já enviamos vários abaixo-assinados pedindo a canalização do córrego sem termos sucesso. Em decorrência disto, insetos de todas as espécies surgem e ameaçam os moradores, sendo frequentes baratas, ratos, moscas e principalmente ratazanas, que invadem as casas e destroem roupas, alimentos, objetos domésticos e até atacam as pessoas, principalmente crianças pequenas.

Paulo Fillinto da Silva, morador antigo de Vila Iara, afirma que dentre os principais problemas está o da falta de uma escola no bairro e o córrego Iara no qual são despejados os esgotos, o que ocasiona a presença de insetos de todas as espécies, e também ratos enormes.

Talita dos Santos diz que sua casa tem buracos de rato e que foi obrigada a tapá-los com cimento.

Tem rato tão grande que come até patinhos novos. Uma vez meu irmão puxou o pato e o rato veio junto, agarrado nele.

Maria Carmen Ferreira acentua que sendo o nível da rua mais alto que o das casas, qualquer chuva mais forte faz com que as águas invadam as residências, estragando os móveis e o sinteko do chão.

Maria Carmen Ferreira diz que qualquer chuva mais forte faz com que as águas invadam as residências, estragando os móveis e causando sérios transtornos às pessoas.

Outra moradora, Marilene Oliveira Silva, mostra a frágil pinguela que os moradores construíram para poderem atravessas o córrego e diz que muitas pessoas já escorregaram e caíram dentro dele, machucando-se seriamente. Diz ela:

O córrego já tirou uma boa parte do meu quintal, pois com as inundações ocorre a erosão e a terra desbarranca. No inverno o mau cheiro piora, porque chove menos e as águas ficam mais paradas, com uma cor negra.

Marilene Oliveira da Silva ressalta a inexistência de uma ponte sobre o córrego e diz que muitas pessoas já escorregaram e caíram da pinguela frágil que os moradores construíram.

A Pedreira Morro Grande S. A. detona quatro vezes por dia e essas explosões causam abalo nas casas. 90% delas apresentam rachaduras nas paredes e abalos nas estruturas. Maria Carmen foi obrigada a fazer escoramento em sua casa, pois ela estava correndo perigo de desabar.

A TUSA é a única empresa particular que serve o bairro e mantém poucos ônibus nas linhas Morro Grande-Lapa e Morro Grande-Hospital das Clínicas. O pessoal tem que esperar até uma hora pelos ônibus e são obrigados a pegá-los no ponto inicial, uma vez que eles vão superlotados e não param nos pontos de percurso.

A coleta do lixo é feita duas ou três vezes por semana e isto somente quando o tempo está bom, pois em dias de chuva eles não passam nas ruas. A avenida Eliseo Teixeira Leite, principal via de acesso ao bairro, que foi a primeira estrada de São Paulo, é de terra, toda esburacada, apresentando muitas dificuldades para o trânsito de veículos.

José Bernardes da Silva, jornaleiro há quatro anos na Vila Iara, cita inúmeros problemas, entre eles a falta de orelhões:

[…] tem somente um e ele vive constantemente quebrado, quando funciona, formam-se longas filas para telefonar.

José Bernardes da Silva trabalha como jornaleiro há quatro anos na Vila Iara e diz que faltam orelhões e o único que existe está sempre quebrado.
Comparação: Vila Iara em 1958 e 2021. Fontes: Geoportal Memória e Google Maps

Diário da Noite, São Paulo, Sábado, 17 de fevereiro de 1979.
Fonte: Hemeroteca Digital Brasileira

Sete famílias moram sob o Viaduto Santa Ifigenia (1946)

UM CADAVER SÔBRE A MESA – SOB A CHUVA, O SOL E O FRIO, MOÇOS E VELHOS VIVEM NA MAIOR DAS MISERIAS – DE PERNAMBUCO A SÃO PAULO A PÉ

Aspecto do local em que vivem as sete familias. Os cacarecos, amontoados desordenadamente pelo chão, e os homens sentados aqui e acolá, oferecem um quadro que entristece e comove. Ao sabor dos caprichos do destino, êstes infelizes sofrem as maiores amarguras e desgraças, mas a dor que os irmana tornou-os apaticos e indiferentes, pouco se importando com isto ou aquilo, com a vida ou com a morte.

Quem se dirigir à ala esquerda do Viaduto de Santa Ifigenia, partindo da Praça do Correio assistirá a um espetaculo que, não fôra a realidade cruciante das suas cenas, nos faria duvidas da propria verdade. Sete familias vivem, ali, as suas amarguras diarias, abandonando-se já a sí mesmas, aos vai-e-vens do destino, esperando de “alguem” ou de “alguma coisa” melhores fados. Já não se importam com a vida, e muito menos com a morte. Tudo lhes é indiferente. Entre o choro das crianças, com fome e com frio, os adultos evidenciam a apatia que deles se apoderou. Tudo é dor, é miseria, é desgraça.

O reporter chegou, atravessou todos aqueles cacarecos que atravancam os baixos do Viaduto Santa Efigenia, que se encontrava naquele momento deserto, e dirigiu-se para um deposito da Prefeitura que ali existe. Avistava-se, de longe, seis velas ardendo sobre uma mesa, e figuras humanas ao seu redor. Muitas crianças rastejavam sobre aquele chão imundo. Aproximamo-nos, e vasculhamos com os olhos o recinto. O cadaver de uma criancinha estava sobre a mesa. Não tinha caixão, e apenas um pano azul, em cujos bordos colocaram alguns pedaços de renda barata, cobria o corpo. Ninguem chorava. Indagamos o que acontecera.
– “Esse é o Antonio Carlos, respondeu-nos uma preta gorda. Tem apenas cinco meses. Estava com tosse comprida, e com a chuva dessa noite morreu. Sua mãe chama-se Neusa, veio de Sorocaba há seis meses. Ficou durante um mês no Albergue Noturno, de onde a enxotaram quando teve a criança. Desde aquela época vivem aqui, sob a “ponte”. O senhor precisa ver, moço, quanto sacrificio foi preciso para trazer o cadaver do pobrezinho aqui pro deposito. O fiscal não queria, sob pretexto algum, que ele ficasse aqui. Durante muito tempo esteve aí jogado no chão. Mas um reporter que esteve aqui fez com que o fiscal mudasse de opinião. Mas ninguem sabe onde é que o menino deve ser enterrado, e nem dinheiro para comprar um caixãozinho para ele nós temos. Estamos angariando auxilio para que, ao menos, ele não seja enterrado assim”.
As palavras da preta velha saiam cansadas, mas com indiferença. A dor tornara-se, entre eles, uma coisa comum e de todos os instantes.

“UM DIA VEIO UM HOMEM”

Indagamos do nome da nossa interlocutora.
– “Maria Cecilia dos Santos. Vem de Porto Feliz, há algum tempo. Moravamos, meu marido e meus filhos […] na rua Diogo de Faria, lá na Vila Mariana. Mas um dia, faz já alguns meses, veio um homem e disse que nós teriamos que mudar. Naquele local ia ser construida uma fabrica. Desde então começou nosso martirio. Procuramos durante muito tempo uma casa, um quarto para morar. Mas a resposta era sempre a mesma: “Com crianças é impossivel, não aceitamos”. Tivemos que vir pra cá, porque nem no Albergue Noturno não se aceitam crianças. E aqui já estamos há varios meses, sujeitos ao frio, ao sol e à chuva, comendo o que Deus nos dá e como os homens querem. Nós vamos ficandi aqui até que nos mandem embora ou então até morrer. Eu só peço a Deus que tenha dó das minhas crianças”.

OS FILHOS SEMPRE OS FILHOS

Irene Maria dos Santos veio de Itajubá no Estado de Minas, há 10 anos, a fim de empregar-se em São Paulo. Trabalhava numa casa de “granfinos”. Mas teve um filho. Isto há três anos. A patrôa disse-lhe que com a criança ela não podia ficar ali, despedindo-a. Deu ao pequeno Wilson, esse é o nome do seu garoto mais velho, a uma comadre, e procurou outro emprego. Há um ano, porem dera à luz mais um bebê. E novamente foi despedida. Seu ultimo recurso foi dirigir-se ao Viaduto. Haveria de arranjar um lugarzinho para si e para o seu David. E assim aconteceu: há seis meses que habita os baixos do Viaduto Santa Ifigenia, irmanada pela dor ás demais familias que ali moram.
– “Que é que eu posso fazer? Quero trabalhar e não posso. O pais dos meninos não liga nem para eles e nem para mim. Eu tenho que ficar aqui até que alguma coisa venha mudar tudo, para melhor ou para pior. A vida é assim mesmo, seu reporter – hoje a gente está aqui, amanhã ali. Nesta vida ou na outra, pouco importa”.

Vitalina Alves dos Santos tambem veio de Minas. De Lambari.
– “Disseram-me que a vida aqui em São Paulo era facil. Que aqui tudo eram bom. E há seis meses que estou na cidade. Há seis meses que estamos, meus filhos e eu, passando fome e miseria. Morando debaixo desse viaduto. Pedi emprego inumeros lugares. Mas ninguem quer empregadas com filhos. A minha filha que tem agora 3 anos, fui obrigada a dar ao meu compadre. Este que está aqui comigo é o Washington Luiz, e tem um ano. De vez em quando arranjo algum servicinho para ganhar algum dinheiro. Mas mandam logo a gente embora, porque não pode dormir no emprego: e dormir na casa do patrão com filhos eles não querem. A gente tem que ir vivendo desse jeito mesmo. Outro remedio não tem”.

“EU VOU VOLTAR PARA O INTERIOR”

Maria Aparecida Ribeiro é jovem ainda. Tem apenas 24 anos. Separou-se do marido, que mora em Piracicaba, e há dois meses que vive sob o viaduto. Dorme com seus dois filhinhos – Salvagete e Maria Eunice, com 6 e 2 anos de idade, num velho e rasgado colchão, que está colocado sobre uns caixões.
– “Trabalhar eu não posso, por causa das crianças. Vou passando como Deus quer. Alguns me dão alguma coisa para comer, outros alguns farrapos para vestir. Mas eu vou voltar para o interior. Lá eu nunca vi familia morar assim na rua, tomando sol, chuva, frio e vento, além de passar fome. Lá os homens possuem melhor coração. Todos ajudam a gente, e tambem se pode trabalhar mesmo com filhos. Aqui ninguem quer saber de crianças – parece que têm medo dos meninos”.

DE PERNAMBUCO A S. PAULO ANDANDO

Um homem moreno, de fisionomia decidida, mas fisicamente abatido, magro, tossindo secamente, estava, com as mãos na cabeça, sentado num caixão. Aproximamo-nos, e ele calmamente levantou-se, oferecendo-nos o lugar. Puxamos conversa. Ele falava pausadamente, mas falava bem. O seu linguajar era nordestino.
– José Correia é o meu nome. Minha mulher chama-se Maria José, assim como aquela menina que está sobre o seu colo e que tem um ano e meio de idade. Esta é minha filha tambem e chama-se Djanira e está com oito anos – diz ele apontando para uma garotinha magra e de olhos muito vivos. Nós somos de Brejeiras, que fica no Estado de Pernambuco. Saimos de lá há 28 dias e viemos a pé. Uma vez ou outra conseguiamos alguma “carona” numa carroça ou caminhão. Mas a maior parte do percurso foi feita andando. E as meninas andavam tambem. Soubemos, lá em Pernambuco, onde eu trabalhava na roça, que em São Paulo se vivia bem. A vida lá no nordeste está dificilima. Resolvemos vir para cá. Chegamos ontem. Procurei inutilmente um quarto ou qualquer outro alojamento no qual pudesse abrigar os meus. Foi impossivel encontrar. Tivemos que vir para cá. E aqui estamos sujeitos ao sol, à chuva e ao frio. Não temos dinheiro e procurei trabalho, ontem, mas nada consegui. Vou tentar novamente. Sei que é dificil. Mas ja estamos aqui e tenho que enfrentar a vida. Ou então morrer e deixar perecer os meus de fome.

UM QUADRO IMPRESSIONANTE

Para se imaginar a tristeza daquele quadro e daquelas vida, bastava observar as fisionomias de todos esses infelizes. Mas tudo o que ali estava reunido traduzia miseria. Os cacarecos esparramados pelo chão, velhas canastras, roupas sujas amontoadas em grandes trouxas, farrapos estendidos pelo chão a guisa de cama, tudo era pauperrimo Duas pedras e, sobre elas, atravessadas duas varetas de ferro serviam de fogão. Quatro deles existiam ali. Três estavam apagados e um fumegava. Olhamos o primeiro: uma espuma suja e gordurosa sobrenadavam a um liquido imundo e de côr de terra. Dentro se podia divisar alguns pés de porco, que ali deviam estar desde ontem. A panela era uma lata velha de banha. Esse seria o almoço e o jantar de toda uma familia. No segundo estavam uns restos de arroz e, ao lado, numa outra lata, pedaços de pasteis e de mortadela podre, que deveriam ser requentados e iriam servir de repasto a uma velha e duas crianças. No terceiro havia somente café – um café ralo e mal cheiroso. No ultimo, um pouquinho de feijão estava sendo requentado. Feijão e nada mais. Sobre uma tábua, proxima ao fogão, uns tomates podres iriam servir para a salada.
Isso é o que aquela gente come. Mulheres e crianças. Moços e velhos. Ali nos baixos do Viaduto Santa Ifigenia no coração de São Paulo.

Diário da Noite, 14 de março de 1946

* A grafia original do texto foi mantida, preservando-se quaisquer erros tipográficos.

Fonte: Hemeroteca Digital Brasileira

Breve história do Shopping D

O Shopping D ocupa uma área de 85.000 m², localizada no distrito do Pari, às margens da Marginal Tietê, tendo fácil acesso pelas zonas Norte, Leste e Central.

Até meados dos anos 1980, a região em que o Shopping hoje está instalado era propriedade da municipalidade, sendo uma antiga área devoluta da várzea do rio Tietê1.

Comparativa da região de várzea em 1958 e área ocupada pelo Shopping D em 2020.
Fontes: Geoportal Memória e Google.

A preparação do terreno para a construção do Shopping teve início no primeiro semestre de 1993, pela construtora Cyrela, conforme anúncio veiculado em O Estado de S. Paulo:

PARA LANÇAR UM SHOPPING TÃO ESPECIAL QUANTO O SHOPPING D, NÓS TIVEMOS QUE PREPARAR MUITO BEM O TERRENO.

Há algumas semanas saiu o último caminhão das obras de terraplenagem do Shopping D. Foram 50 mil caminhões de terra, que enfileirados ligariam São Paulo à Belo Horizonte. Foram milhares de horas, homens e máquinas para deixar o terreno perfeito para a construção do Shopping D. Quem passa pela Marginal Tietê na Ponte Cruzeiro do Sul, percebe que a força de atração que este novo ponto vai exercer sobre a cidade. Shopping D. O primeiro shopping center especializado em ofertas permanentes, preços baixos e venda direta ao consumidor. A Cyrela vem trabalhando firme para concretizar essa nova alternativa de negócios para a indústria e o comércio, e se empenhando para entregar cada etapa da obra em seu prazo. E fazer o Shopping D crescer a olhos vistos. Shopping D. O Shopping do Desconto.

Anúncio veiculado em 11 de maio de 1993 em O Estado de S. Paulo

Segundo anúncios da época, o Shopping D se destacaria por abrigar cerca de 300 estabelecimentos comerciais, entre eles “lojas de fábrica, pontas de estoque e outras formas de venda direta ao consumidor, oferecendo “ofertas permanentes e preços baixos”. O conceito buscado pelos empreendedores era o de shopping “self service”, dispensando intermediários e barateando custas nas vendas, visando atrair um público interessado em preços mais em conta, sem apostar em grandes marcas:

Seu projeto foi concebido para aumentar o poder de atração quem vende barato, sem aumentar seus custos de operação. Sua localização e acessos são privilegiados: Marginal Tietê, a dois minutos do centro de São Paulo. Implantado no eixo do sistema rodo-metroviário, o Shopping D vai atrair clientes de toda a cidade.

Anúncio veiculado em 4 de abril de 1993 em O Estado de S. Paulo

A fundação do Shopping ficou a cargo da SCAC:

Graças ao trabalho da SCAC, uma das maiores e mais especializadas empresas de fundações, o SHOPPING D está com toda a fundação pronta para receber a estrutura. É uma das etapas mais importantes da construção. Pena que só da pra ver neste anúncio. E enquanto você lê, a gente continua o trabalho. Afinal, daqui a pouco, todo mundo vai aproveitar os preços baixos, as ofertas permanentes e a estrutura do maior e mais inteligente shopping de venda direta do país. O Shopping D.

Anúncio veiculado em 28 de maio de 1993, em O Estado de S. Paulo
Fundações do Shopping D, 1993.

A estrutura do empreendimento ficou a cargo da Costa Previato:

A Costa Previato é a empresa de engenharia que está levantando a estrutura do Shopping D. Só para você ter uma idéia, a quarta laje já foi concluída bem antes do prazo, e com a maior qualidade, tecnologia e experiência. Em 5 meses serão 57.000 m². Mas você não precisa esperar para conhecer o mais completo shopping de ofertas e vendas direta do Brasil. É só passar pela Marginal Tietê, junto à Ponte Cruzeiro do Sul e ver que o Shopping D está crescendo a olhos vistos.

Anúncio veiculado em 17 de junho de 1993 em O Estado de S. Paulo
Shopping D em construção, 1993.

Antes mesmo de sua inauguração, já era possível encontrar anúncios informando algumas lojas que se instalariam futuramente no Shopping D. Entre elas estava:
Tennishop, Seis de Ouro Discos, Agência do Banco Bandeirantes, Dujô, G. Aronson, DB Brinquedos, Hering Têxtil, Teka, Le Postiche, Lupo, Mc Donald’s, Viajando, Pizzer, Toothpick, Birello entre outras.

Desenho exibindo fachada do Shopping D, 1993

Em 1994, prestes a inaugurar, a descrição do Shopping abrangia uma vasta gama de opções. Entre elas:

  • Lojas de fábrica: roupas e calçados;
  • Pontas de estoque: perfumaria e acessórios;
  • Eletrodomésticos;
  • Grandes lojas especializadas: brinquedos, artigos esportivos e discos;
  • Importados: Loja One Dollar e Loja One to Five Dollars;
  • Serviços: drogaria, banco, produtos veterinários e papelaria.
Shopping D em 1994.

A inauguração do Shopping estava prevista para o dia 5 de outubro (para lojistas) e 6 de outubro para o público em geral. O número de escadas rolantes e a quantidade de vitrines presentes no prédio figuravam entre as estatísticas divulgadas para a promoção do local:

Área total: 56.000 m²
Número de pisos: 2 de lojas e 3 de estacionamento
Escadas rolantes: 4
Elevadores panorâmicos: 3
Número de lojas: 320
Vitrines: 1,28 km
Restaurantes/lanchonetes: 20
Vagas do estacionamento: 1.300 para carro e 20 vagas para ônibus.
Tempo de construção: 2 anos

No dia 6 de outubro de 1994, finalmente o Shopping D foi inaugurado e sem surpresas, conforme noticiado, foi invadido por uma multidão de clientes curiosos:

SHOPPING D ABRE E É INVADIDO POR MULTIDÃO

Proposta é vender produtos a preços mais baixos porque todas as lojas são de fábricas.

Mal abriu suas portas, ao meio-dia de ontem, o Shopping D, que fica na Marginal do Tietê com entrada pela Avenida Cruzeiro do Sul, foi tomado de assalto por uma multidão que esperava desde as 10 horas para conhecer novidades e aproveitas ofertas. O movimento surpreendeu até os donos das lojas. A da Hering, por exemplo, teve que colocar funcionários na porta para regular a entrada das pessoas que disputavam os agasalhos de moleton, cotados a R$ 6,00.

O Shopping D (a letra se refere, segundo os idealizadores do empreendimento, a desconto, diferente, direto, dado e demais, entre outros adjetivos) não é exatamente um shopping, mas um outlet center ou centro de lojas de fábricas. Esse conceito foi lançado por empresários norte-americanos há 22 anos na cidade de Reading, Estado da Pensilvânia. A proposta do shopping, que possui 323 lojas e funciona das 9 horas às 22 horas, é vender produtos mais baratos, porque as mercadorias saem das mãos do fornecedor diretamente para o consumidor, eliminando-se a figura do intermediário.

Trecho extraído de artigo escrito por Rosa Bastos, publicado em O Estado de S. Paulo em 07 de outubro de 1994.
Shopping D, década de 2010.

Ao longo dos anos, o Shopping D perdeu as características iniciais de “outlet” visadas pelos seus idealizadores, abandonando o modelo self service e abrigando lojas que adotam modelos convencionais, com empregados para intermediar as compras, por exemplo.

Atualmente, embora o Shopping D permaneça ativo, a saturação do mercado varejista causada pelo construção de novos de shoppings na região norte de São Paulo, o crescente aumento do comércio online, e a também a degradação dos bairros em seu entorno, parecem ter contribuído para a diminuição de seu público frequentador.

Em 2019, o Shopping D completou 25 anos e não houve qualquer sinal de campanhas de marketing promovendo seu aniversário, promoções ou qualquer coisa do tipo. Até mesmo no período de festas de fim de ano, o Shopping tem demonstrado pouco esforço para atrair clientes, com decorações discretas e campanhas publicitárias praticamente inexistentes.

Aos 26 anos de idade, o Shopping D demonstra sinais de um declínio que não é de sua exclusividade, mas de grande parte dos Shopping construídos há mais de duas décadas. Diante deste cenário, só nos resta esperar para ver se, assim como nos EUA, os Shopping Centers atingirão seu limite, seguidos de um bruto colapso causando o fechamento de vários estabelecimentos desta categoria, ou se o caso brasileiro se diferenciará dos norte-americanos, conseguindo manter vivos seus shoppings.