Caos no Cine Bom Retiro

DURANTE UM ESPECTACULO GRATUITO O POVO TENTOU INVADIR O CINE BOM RETIRO

VERIFICARAM-SE ATROPELOS E CORRERIAS NA PORTA DO CINEMA

Ante-hontem, durante a exhibição do filme “Loucuras de um beijo”, no Cine-Theatro Bom Retiro, á rua José Paulino, queimou-se um dynamo, tendo havido interrupção do espectaculo.

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Como era natural, surgiram protestos dos espectadores, que chegaram a damnificar poltronas e cartazes. A empresa do cinema, procurando acalmal-os prometteu que hontem o filme seria exhibido gratuitamente, podendo os que se encontravam no theatro retirar as respectivas senhas.

Os atropelos, porém, que se verificaram impediram que taes senhas fossem distribuidas. Isso não impediu, entretanto, que a empresa cumprisse o promettido. Hontem, desde ás 16 horas, tiveram inicio sessões gratuitas em que era exhibido o filme da vespera.

Durante o dia, quando senhoras e crianças acorreram ao cinema, nada de anormal se verificou. Á noite, na sessão das 19 horas, é que tiveram lugar os primeiros disturbios. Em frente ao cinema agglomeravam-se perto de tres mil pessoas, de tal sorte que a empresa, na impossibilidade de manter a ordem, appelou para a policia. Para o local partiram, então, varios subdelegados com guardas-civis, soldados de infantaria e cavallaria da Força Publica.

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Cine Theatro Bom Retiro

A ordem foi restabelecida, formando-se cordões para a entrada dos espectadores até o limite da lotação do cinema. Mas, quando a empresa affixou um cartaz avisando que ás 22 horas se realizaria a ultima sessão, nova agitação se verificou.

Os que se sentiam prejudicados tentaram invadir o cinema obrigando á policia a usar de meios violentos. Varios excessos foram então praticados de parte a parte. Os policiaes, de espadim em punho, investiram, contra os que discuidadamente se collocavam fóra das filas organizadas pela autoridade.

O espectaculo que se desenrolava na rua José Paulino foi, para muitos dos que ali se agglomeraram, o unico que presenciaram…

Diario Nacional, São Paulo 12 de agosto de 1931
Fonte: Hemeroteca Digital Brasileira

¹O texto original foi transcrito em sua integralidade, mantendo-se a grafia da época, assim como quaisquer erros tipográficos.

 

Os “gangsters” paulistanos estão em scena

Um inspector de policia gravemente ferido pela turma do “quebra tudo”

No ambiente policial, notava-se hoje desusada effervescencia. Um inspector de policia, aggredido pelas costas, cerca das 4 horas da madrugada de hoje, tombou gravemente ferido em plena avenida São João sendo, despojado das armas, dinheiro e da capa que levava no hombro.
Todos os collegas do policial – que se encontra recolhido ao leito em estado melindroso – traziam o cenho carrancudo e só pediam uma cousa aos chefes, um revide em regra.

Os autores da façanha são os mesmos que ha tempos aterrorizam os centros bohemios da capital: a turma do “Quebra Tudo”. Hoje o chefe é outro: o “Rosquinha”, elementos de pessimos antecedentes se bem que pertença á burguezia da nossa “urbs”…
Verdadeiros “gangsters”, dispostos a qualquer crime, dedicam-se a treinos… suaves, assaltando, espancando, depredando. Uma verdadeira vergonha que deve cessar.

Cabe á nossa policia empregar um drastico immediato para acabar com esse cancro social que perambula, saturado de cocaina, pelas ruas do centro, altas horas da madrugada.
Nenhuma contemplação para os “quebra-tudo”. É necessario combatel-os sem treguas, fazendo-os expiar o mal que praticam.

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Largo do Paissandu, 1935

UMA AGGRESSÃO COVARDE

O inspector da Delegacia de Ordem Politica e Social, Affonso Mendes, n. 106, ás 4 horas da madrugada de hoje, depois de ter effectivado uma diligencia, encaminhava-se para a sua residencia. Para tanto, teve que atravessar a avenida São João. Nas proximidades do largo do Paysandú, foi abordado por dois rapazes, elegantemente trajados. Enquanto o inspector respondia a uma pergunta de um delles, outros individuos se lhe acercaram desferindo-lhe, na nuca, uma fortissima pancada. Atordoado, o inspector cahiu ao solo. Então o grupo saciou a sanha, esbordoando impiedosamente a victima, que teve todos os dentes partidos e o osso do nariz fracturado. Em seguida arrancaram o revolver do policial e o ordenado que ha pouco tinha recebido. Não contentes com isso, carregaram uma capa gabardine.
Unica testemunha do caso foi um padeiro que ouviu perfeitamente dizer:
– Mata esse… É um “tira”!

INSPECTORES QUE PEDEM UMA LICENÇA “SUI GENERIS”

Sentindo justissima revolta contra o attentado que victimou um companheiro, os inspectores da Delegacia de Ordem Politica e Social pediram ao delegado uma licença “sui generis”: carta branca para “quebrarem” os valentes. Havia lagrimas nos olhos dos rudes inspectores, quando fizeram o pedido. Sentiam grande ansia para revidarem á altura o covarde attentado.
O dr. Costa Ferreira recommendou calma, fazendo ver que, sem se recorrer á violencia, os culpados seriam punidos. Uma communicação do succedido foi enviada ao major Cordeiro de Faria que determinará quaes as medidas a serem tomadas contra os criminosos que formam o grupo de assaltantes.

Folha da Noite, 21 de novembro de 1931.
Fontes:
Acervo Folha
Acervos da Cidade