Em entrevista ha dias concedida a um matutino, affirmou o major Fonceca uma cousa que merece contestação.
Não desejamos affirmar, em absoluto, que o d. presidente da Camara Municipal de S. Paulo tenha deixado escapar, conscientemente, uma inverdade.
Mas s. s., que no inicio do caso da pacificação andou por caminho errado, por não estar ha muito enfronhado nas tricas e futricas do esporte, naturalmente pela mesma razão deu àquelle jornal uma informação mal segura.
Fel-o quando affirmou que “si até agora o Governo do Estado não procedeu á construcção de um estadio, deve-se isto á dissidencia existente no esporta paulista. Posso assegurar que, logo que se tenha verificado a pacificação, serão tomadas as providências necessarias para a edificação desta obra que todos nós desejamos. O respectivo terreno foi doado pela Cia. City, em um optimo local do Pacaembú, já estando passada a competente escriptura, o que não póde deixar duvidas a respeito do que affirmo”.
Si nos permitte o major Fonceca, vamos narrar o que de exacto ha sobre o assumpto.
Esse caso da doação de um terreno pela Cia. City, ao governo do Estado, para a construcção obrigatoria de um estadio, é mais velho do que se pensa, e não é o dissidio que tem impedido a sua effectivação.
Sinão, vejamos.
Já em 1921, nos ultimos mezes do anno, doou aquella companhia, dos seus terrenos situados no Pacaembú, uma area ao governo do Estado — na época presidido pelo dr. Washington Luis — para a construcção de um estadio.
O presidente do Estado incontinente nomeou para cuidar do assumpto uma commissão composta de tres membros: o dr. Benedicto Montenegro, presidente da Associação Paulista de Esportes Athleticos, na época a unica entidade dos esportes terrestres em S. Paulo; sr. Antonio Prado Junior, presidente do C. A. Paulistano, e o dr. Alfredo Braga, engenheiro-director das Obras Publicas da Secretaria da Agricultura.
Em uma assembléa da A. P. E. A. foi solicitada permissão para que essa entidade dispendesse até cem contos do seu patrimonio em propaganda, caução no thesouro e premios para as plantas do futuro estadio — o que por ella foi concedido.
A commissão organisada visitou o terreno, doado e fizeram-se varias publicações a respeito, havendo o governo promettido que a pedra inaugural do estadio seria lançada pelo centenario da proclamação da nossa independencia politica.
Não se sabe porque, infelizmente a ideia não foi levada adiante, e a commissão foi dissolvida.
Durante o anno passado o Palestra desejou obter o terreno do governo, ficando com a obrigação de fazer o estadio que construiria com o producto da venda do Parque Antarctica.
Mas o Paulistano tambem, na occasião, poz-se a desejar para si o terreno, para fazer o seu novo campo.
E a Companhia City fez questão de que o alvi-rubro tivesse preferencia no negocio. Assim, mandou consultar o presidente do E. C. Syrio sobre a permuta do campo do Jardim America, avaliado em 3 mil contos, pelo terreno do club Syrio, avaliado em 1000 contos, voltando naturalmente a differença o gremio do sr. Dabague.
O E. C. Syrio, achando difficil levantar cerca de dois mil contos, não acceitou o negocio.
Assim, o Paulistano ficou no Jardim America, o Syrio, na Ponte Grande, o Palestra resolveu fazer o seu estadio mesmo no Parque Antarctica, e o terreno do Pacaembú abandonado, aguarda melhores dias…
É esta a verdade sobre o caso.
Trecho extraído da Folha da Manhã, 13 de junho de 1929.
Fonte: Acervo Folha
¹O texto original foi transcrito em sua integralidade, mantendo-se a grafia da época, assim como quaisquer erros tipográficos.
Legenda das imagens:
Esquerda: fotografia aérea da região do vale do Pacaembu. Sem data. Fonte: Acervo Cia City. http://www.ciacity.com.br/
Direita: Google Maps (2020)