Patins, sucos, cabelos curtos — O jovem carioca em 1980

Alguns dos itens necessários para compor o jovem de hoje:

Patins — Item básico do equipamento do broto. De diversos tipos, variam de 3.000 a 20.000 cruzeiros. O mais transado é o Torlay (15.000 cruzeiros). Joelheiras e cotoveleiras (730) e munhequeiras (360) são indispensáveis. No Rio, patina-se no Canecão e no Roxy Roller, da Lagoa. São Paulo tem mais de dez pistas — surgidas apenas este ano —, cujo ingresso varia de 50 a 300 cruzeiros. As mais quentes são o Rink e o Roxy Roller.

Alimentação Natural — À parte sanduíches vegetarianos, o grande must são os sucos. De combinações as mais esdrúxulas — mamão com maçã, laranja com morango —, custam 40 cruzeiros. Pão caseiro e chás que curam tudo, de enxaqueca a gordura, são também muito consumidos.

Cabelos — Nas meninas, trancinhas e rabos-de-cavalo, presos por conchas do mar e outros berloques. Cara limpa, sem pinturas: no máximo, um lápis. Para os meninos, a nuca batida não pegou: o corte é convencional, estilo “Papai Mandou”.

Roupas — Ao contrário da geração anterior, a dos brotos de hoje se veste rigorosamente bem. Para meninas, as minissaias têm cores pastéis (azul-claro, verde-água), e os preços variam de 640 a 2.000 cruzeiros. Além disso, bermudões, sapatinhos de pano, chapeuzinhos, perfumes e cosméticos naturais, à base de ervas. Para garotos, camisetas com muita cor e inscrições em inglês (800). Para ambos, a calça baggy já caiu de moda: o quente é a nem muito larga nem muito justa, com a boca saindo reta. O sapato é o Top Sider (1.780 cruzeiros).

Música, dança — O aparelho de som é a “menina dos olhos”: todos procuram ter o seu. Sem ídolos em especial, os jovens gostam de escutar “um som” e assistem aos shows dançando o tempo todo. Com o fim das discotecas, a maioria fica só nas pistas de patins. No Rio, após o Canecão, estica-se no Pizza Palace, em Ipanema, ou no Caribe, em São Conrado.

Gírias — Algumas gírias que já se consagram entre os jovens:

Brotinho — Soa década de 50, mas é como estão sendo chamadas as da segunda geração de “cocotas”.
Dar valor — Preferir. “O baixo Leblon já era, dou valor ao Pizza Palace.”
Dragão, Jaburu — Menina feia.
Nas internas — Entre o grupo, “Isso a gente discute nas internas.”
Roupa — Cocaína. “Tem roupa aí?”
Salcero — Confusão. “Arrepiou o maior salcero no social do brotinho.” Ou, teve briga na festa da “gatinha”.
Social — Equivalente festivo do visual. Um campeonato de windsurf é um tremendo visual. A festa de comemoração, depois, é um social.
Rapeizes, Tchiurma — O grupo. Quem frequenta os mesmos sociais é da tchiurma. São os rapeizes, que incluem os dois sexos.

Matéria veiculada em 5 de novembro de 1980.
Fonte: VEJA SP

Breve história do Shopping D

O Shopping D ocupa uma área de 85.000 m², localizada no distrito do Pari, às margens da Marginal Tietê, tendo fácil acesso pelas zonas Norte, Leste e Central.

Até meados dos anos 1980, a região em que o Shopping hoje está instalado era propriedade da municipalidade, sendo uma antiga área devoluta da várzea do rio Tietê1.

Comparativa da região de várzea em 1958 e área ocupada pelo Shopping D em 2020.
Fontes: Geoportal Memória e Google.

A preparação do terreno para a construção do Shopping teve início no primeiro semestre de 1993, pela construtora Cyrela, conforme anúncio veiculado em O Estado de S. Paulo:

PARA LANÇAR UM SHOPPING TÃO ESPECIAL QUANTO O SHOPPING D, NÓS TIVEMOS QUE PREPARAR MUITO BEM O TERRENO.

Há algumas semanas saiu o último caminhão das obras de terraplenagem do Shopping D. Foram 50 mil caminhões de terra, que enfileirados ligariam São Paulo à Belo Horizonte. Foram milhares de horas, homens e máquinas para deixar o terreno perfeito para a construção do Shopping D. Quem passa pela Marginal Tietê na Ponte Cruzeiro do Sul, percebe que a força de atração que este novo ponto vai exercer sobre a cidade. Shopping D. O primeiro shopping center especializado em ofertas permanentes, preços baixos e venda direta ao consumidor. A Cyrela vem trabalhando firme para concretizar essa nova alternativa de negócios para a indústria e o comércio, e se empenhando para entregar cada etapa da obra em seu prazo. E fazer o Shopping D crescer a olhos vistos. Shopping D. O Shopping do Desconto.

Anúncio veiculado em 11 de maio de 1993 em O Estado de S. Paulo

Segundo anúncios da época, o Shopping D se destacaria por abrigar cerca de 300 estabelecimentos comerciais, entre eles “lojas de fábrica, pontas de estoque e outras formas de venda direta ao consumidor, oferecendo “ofertas permanentes e preços baixos”. O conceito buscado pelos empreendedores era o de shopping “self service”, dispensando intermediários e barateando custas nas vendas, visando atrair um público interessado em preços mais em conta, sem apostar em grandes marcas:

Seu projeto foi concebido para aumentar o poder de atração quem vende barato, sem aumentar seus custos de operação. Sua localização e acessos são privilegiados: Marginal Tietê, a dois minutos do centro de São Paulo. Implantado no eixo do sistema rodo-metroviário, o Shopping D vai atrair clientes de toda a cidade.

Anúncio veiculado em 4 de abril de 1993 em O Estado de S. Paulo

A fundação do Shopping ficou a cargo da SCAC:

Graças ao trabalho da SCAC, uma das maiores e mais especializadas empresas de fundações, o SHOPPING D está com toda a fundação pronta para receber a estrutura. É uma das etapas mais importantes da construção. Pena que só da pra ver neste anúncio. E enquanto você lê, a gente continua o trabalho. Afinal, daqui a pouco, todo mundo vai aproveitar os preços baixos, as ofertas permanentes e a estrutura do maior e mais inteligente shopping de venda direta do país. O Shopping D.

Anúncio veiculado em 28 de maio de 1993, em O Estado de S. Paulo
Fundações do Shopping D, 1993.

A estrutura do empreendimento ficou a cargo da Costa Previato:

A Costa Previato é a empresa de engenharia que está levantando a estrutura do Shopping D. Só para você ter uma idéia, a quarta laje já foi concluída bem antes do prazo, e com a maior qualidade, tecnologia e experiência. Em 5 meses serão 57.000 m². Mas você não precisa esperar para conhecer o mais completo shopping de ofertas e vendas direta do Brasil. É só passar pela Marginal Tietê, junto à Ponte Cruzeiro do Sul e ver que o Shopping D está crescendo a olhos vistos.

Anúncio veiculado em 17 de junho de 1993 em O Estado de S. Paulo
Shopping D em construção, 1993.

Antes mesmo de sua inauguração, já era possível encontrar anúncios informando algumas lojas que se instalariam futuramente no Shopping D. Entre elas estava:
Tennishop, Seis de Ouro Discos, Agência do Banco Bandeirantes, Dujô, G. Aronson, DB Brinquedos, Hering Têxtil, Teka, Le Postiche, Lupo, Mc Donald’s, Viajando, Pizzer, Toothpick, Birello entre outras.

Desenho exibindo fachada do Shopping D, 1993

Em 1994, prestes a inaugurar, a descrição do Shopping abrangia uma vasta gama de opções. Entre elas:

  • Lojas de fábrica: roupas e calçados;
  • Pontas de estoque: perfumaria e acessórios;
  • Eletrodomésticos;
  • Grandes lojas especializadas: brinquedos, artigos esportivos e discos;
  • Importados: Loja One Dollar e Loja One to Five Dollars;
  • Serviços: drogaria, banco, produtos veterinários e papelaria.
Shopping D em 1994.

A inauguração do Shopping estava prevista para o dia 5 de outubro (para lojistas) e 6 de outubro para o público em geral. O número de escadas rolantes e a quantidade de vitrines presentes no prédio figuravam entre as estatísticas divulgadas para a promoção do local:

Área total: 56.000 m²
Número de pisos: 2 de lojas e 3 de estacionamento
Escadas rolantes: 4
Elevadores panorâmicos: 3
Número de lojas: 320
Vitrines: 1,28 km
Restaurantes/lanchonetes: 20
Vagas do estacionamento: 1.300 para carro e 20 vagas para ônibus.
Tempo de construção: 2 anos

No dia 6 de outubro de 1994, finalmente o Shopping D foi inaugurado e sem surpresas, conforme noticiado, foi invadido por uma multidão de clientes curiosos:

SHOPPING D ABRE E É INVADIDO POR MULTIDÃO

Proposta é vender produtos a preços mais baixos porque todas as lojas são de fábricas.

Mal abriu suas portas, ao meio-dia de ontem, o Shopping D, que fica na Marginal do Tietê com entrada pela Avenida Cruzeiro do Sul, foi tomado de assalto por uma multidão que esperava desde as 10 horas para conhecer novidades e aproveitas ofertas. O movimento surpreendeu até os donos das lojas. A da Hering, por exemplo, teve que colocar funcionários na porta para regular a entrada das pessoas que disputavam os agasalhos de moleton, cotados a R$ 6,00.

O Shopping D (a letra se refere, segundo os idealizadores do empreendimento, a desconto, diferente, direto, dado e demais, entre outros adjetivos) não é exatamente um shopping, mas um outlet center ou centro de lojas de fábricas. Esse conceito foi lançado por empresários norte-americanos há 22 anos na cidade de Reading, Estado da Pensilvânia. A proposta do shopping, que possui 323 lojas e funciona das 9 horas às 22 horas, é vender produtos mais baratos, porque as mercadorias saem das mãos do fornecedor diretamente para o consumidor, eliminando-se a figura do intermediário.

Trecho extraído de artigo escrito por Rosa Bastos, publicado em O Estado de S. Paulo em 07 de outubro de 1994.
Shopping D, década de 2010.

Ao longo dos anos, o Shopping D perdeu as características iniciais de “outlet” visadas pelos seus idealizadores, abandonando o modelo self service e abrigando lojas que adotam modelos convencionais, com empregados para intermediar as compras, por exemplo.

Atualmente, embora o Shopping D permaneça ativo, a saturação do mercado varejista causada pelo construção de novos de shoppings na região norte de São Paulo, o crescente aumento do comércio online, e a também a degradação dos bairros em seu entorno, parecem ter contribuído para a diminuição de seu público frequentador.

Em 2019, o Shopping D completou 25 anos e não houve qualquer sinal de campanhas de marketing promovendo seu aniversário, promoções ou qualquer coisa do tipo. Até mesmo no período de festas de fim de ano, o Shopping tem demonstrado pouco esforço para atrair clientes, com decorações discretas e campanhas publicitárias praticamente inexistentes.

Aos 26 anos de idade, o Shopping D demonstra sinais de um declínio que não é de sua exclusividade, mas de grande parte dos Shopping construídos há mais de duas décadas. Diante deste cenário, só nos resta esperar para ver se, assim como nos EUA, os Shopping Centers atingirão seu limite, seguidos de um bruto colapso causando o fechamento de vários estabelecimentos desta categoria, ou se o caso brasileiro se diferenciará dos norte-americanos, conseguindo manter vivos seus shoppings.


Atinge a violência o movimento anti-semita surgido em S. Paulo (1960)

Forçaram a porta, atingiram o patio, mas foram rechaçados — Intranquilidade na colonia israelita desta Capital — Policia oferece garantias: policiadas as sociedades judaicas e guarnecidas as sinagogas — Os episodios de ontem são uma negação à história e a à tradição do povo brasileiro

Um grupo de dez a quinze jovens invadiu a sede da Congregação Israelita Paulista na madrugada de ontem, depois de pintar slogans anti-semitas na parede externa do edifício.

De acordo com as declarações de Antonio Angelino da Silva, porteiro da entidade, e que foi ouvido ontem no Departamento da Ordem Politica e Social, os manifestantes forçaram a porta da rua e alcançaram o patio interno do predio, mas foram rechaçados, fugindo num automovel. Disse que os reconhecerá se a Policia os puser à sua frente.

Antonio Angelino da Silva, quando prestava declarações no DOPS

O fato ocorreu por volta das 3,30 horas da madrugada e às 8 horas foi comunicado ao diretor administrativo da Congregação, sr. Hans Feuereisen, que entrou logo em contato com a policia politica.

A polícia oferece garantias à porta dos templos e de entidades israelitas

O delegado Italo Ferrigno determinou que se efetuassem investigações em torno do caso e obteve completo esclarecimento, segundo adiantou à reportagem, recusando-se entretanto a revelar nomes “por ser prejudicial ao andamento das diligencias”. Para garantir templos e entidades judaicas de São Paulo e do ABC, foram designados 22 investigadores. Oito viaturas da Radio Patrulha guarnecem as sinagogas, a fim de evitar que se reeditem os acontecimentos de ontem.

A CRUZ GAMADA

A cruz gamada, símbolo do nazismo, apareceu nas inscrições pintadas na parede da Congregação, numa sinagoga da Bela Vista e nos tapumes de uma construção na rua Brasilio Machado, esquina com Baronesa de Itu, bairro de Santa Cecília. Ao lado da “swastica”, liam-se frases terroristas tais como: “Morte aos judeus”,, “São lobos, não são ovelhas”, ou simplesmente “Vá pra casa, judeus”.

A “swastica”, simbolo do nazismo anti-semita, amanheceu ontem na parede da Congregação Israelita Paulista. Ao lado, a inscrição hostil: “Vá pra casa, judeu”

PRISÃO DE UM PINTOR

Em São Bernardo do Campo, proximo a uma sinagoga, investigadores detiveram um individuo que passava sobraçando material para pintura. Provou que era pintor (por ironia, a mesma profissão de Hitler) e se dirigia para o trabalho, sendo posto em liberdade.

O delegado Italo Ferrigno acredita que o movimento não recrudescerá em São Paulo. “O fato deve ter origem na irresponsabilidade de alguns mocinhos que não pensaram estar brincando com a coisa tão séria”, ponderou aquela autoridade. Lembrou contudo que deve haver um “cabeça” que organizou tudo e que tentará repetir a façanha”.

Já o presidente do Conselho da Federação Israelita, sr. Moisés Kaufmann, mostrava-se apreensivo com os acontecimentos: “Estamos indignados com esse atendimento vergonhoso. Querem implantar no Brasil um estado de coisas lamentavel, de melancolica memoria: a perseguição racista, coisa que nunca se viu neste país”.

O presidente do Conselhos da Federação fazia-se acompanhar ainda do sr. Ernesto Kock, presidente da Congregação Israelita Paulista, do sr. Romeu Mindlin, filiado a essa entidade, e do deputado Jacob Zveibel.

TERRORISTAS E NÃO “PLAY-BOYS”

— “Lamentamos não somente por nós, mas tendo em vista o povo que nos acolheu e nos deu um lugar para viver em plena liberdade e gozo dos direitos democraticos” disse o sr. Hans Feuereisen, presidente da Congregação Israelita Paulista, solicitado a se manifestar sobre o assunto na sede da entidade de que é diretor administrativo. Esclareceu que os autores da provocação anti-judaica chegaram a violar o recinto da Congregação, conforme atestou o porteiro da noite. “Isso prova” sentenciou “que não se trata de mera brincadeira de gaiatos”.

Sr. Hans Feuereisen: “As hostilidades ultrapassam os limites da aventura inconsequente”

Aduziu que se a intenção dos manifestantes não tivesse um fundo preconcebido e perigoso, eles teriam pintado a parede às escondidas. O fato de haverem invadido o patio da entidade, forçando a porta, é indicio de que seus objetivos ultrapassavam os limites da pura e simples aventura de vandalos inconsequentes”.

Informou ainda que reinava grande inquietação no seio da coletividade israelita e a expectativa e apreensão estendiam-se a cerca de setenta entidades existentes em São Paulo que, juntamente com as do Rio, reunem 75 por cento da população judia do Brasil, constituida de cerca de 150 mil pessoas. “Certamente há o que temer”, acrescentou. “Vejamos os proximos dias… ou noites”.

RENASCE O TERRORISMO

Rabino Menahem W. Diesendruck: “Não adianta punir os malfeitores. Os fatos se repetirão. Urge uma campanha de esclarecimento”

“Minha interpretação desses fatos resume-se numa unica ideia”, afiançou-nos o rabino Menahem W. Diesendruck. “O germe venenoso do nazismo não foi ainda extirpado na Alemanha. Remanescentes da ditadura do Fuherer ainda hoje ocupam posições especialmente no ensino. No Brasil, tal não acontece, mas essas explosões de odio anti-semita podem ser atribuidas a um movimento internacional. Nos dias de hoje, Adenauer esforça-se por apagar essa pagina dolorosa que Hitler escreveu. O nazismo pretende renascer e com ele o terrorismo internacional para desmoralizar a desnazificação da Europa. As provocações continuarão enquanto não se empreender uma campanha de esclarecimento da juventude, ensinando os moços a ler na Historia o horror deflagrado pela paixão militarista do regime implantado na Alemanha por Hitler. Parece que o holocausto de seis milhões de judeus ainda não serviu para advertir o mundo das tragicas consequencias que poderão advir dessa onde de perversidade que ameaça varrer de novo o continente europeu e avançar contra o mundo. “Em relação ao Brasil, não adianta caçar os malfeitores. Esse movimento é dirigido por um interesse internacional facilmente identificavel e voltado para o exterminio da raça judaica. Casos semelhantes têm-se registrado no Chile, Inglaterra, Finlandia e deverão repetir-se na America do Sul”, concluiu.

TELEFONEMAS ANONIMOS E CARTAS AMEAÇADORAS

O recrudescimento das violências anti-semíticas na Europa e em alguns países da América do Sul, tem colocado em sobressalto os judeus radicados em São Paulo. O delegado Italo Ferrigno recebeu queixas de elementos da colonia israelita, que estão sendo vítimas de provocações através de telefonemas anônimos e de outras formas não menos ameaçadoras. O Círculo Israelita de São Paulo recebeu cartas, assinadas por “um integralista”, vazadas em termos rancorosos, em que o remetente acusa judeus de horripilantes crimes contra a humanidade.

Diário da Noite, São Paulo, 7 de janeiro de 1960.
Fonte: Hemeroteca Digital Brasileira

*A grafia original foi mantida, bem como quaisquer erros de acentuação, pontuação etc.