São Paulo não tem 6% de sua area cobertos de florestas primitivas
Os objetivos da Sociedade amigos da Flora e Fauna Brasileiras ‒ Declarações do sr. Agenor Couto Magalhães ao JORNAL DE NOTICIAS
A reportagem do JORNAL DE NOTICIAS teve a oportunidade de se avistar ainda uma vez com o sr. Agenor Couto de Magalhães, presidente da Sociedade Geografica Brasileira, vice-presidente da novel Sociedade Amigos da Flora e da Fauna e notavel estudioso dos problemas de que se ocupam essas entidades, tendo mesmo escrito varias obras interessantes e de valor indispensavel, como sejam “Monografia Brasileira de Peixes Fluviais”, “Ensaio sobre a fauna brasileira”, com apresentação do naturalista Hans Krieg, diretor do Museu de Zoologia de Munich, Alemanha, “Encantos do Oeste” e uma tradução da obra de Jean Rosian, intitulada “Vida Sexual dos Animais”.
Falando sobre os objetivos primeiros da Sociedade Amigos da Flora e da Fauna Brasileiras, que ora se funda, declarou o sr. Couto de Magalhães que visa incentivar nos estabelecimentos de ensino, por meio de circulares, da imprensa e do radio, o amor dos brasileiros e de todos aqueles que conosco compartilham a defender o patrimonio nacional, isto é, tudo aquilo que a natureza prodigamente nos deu.
Os problemas a serem atacados, continua, são multiplos e complexos. Para se avaliar a extensão deles, acentua, basta que nos reportemos à devastação desordenada das nossas matas que determinará o desaparecimento da fauna e consequentemente a alteração do clima e a diminuição progressiva dos mananciais de agua.
DESAPARECEM ASSUSTADORAMENTE AS FLORESTAS
É do conhecimento publico, diz, prosseguindo o nosso entrevistado, que o Estado de São Paulo, tinha em 1930, 26% da sua area total coberta por florestas primitivas e, decorridos 47 anos, menos de meio seculo, São Paulo não chega a ter 6% da sua area territorial com aquele revestimento primitivo. Esse aniquilamento de uma das principais riquezas do Estado, frisa, determina tambem o desaparecimento da fauna fluvial, pois bem certo é que com o desmatamento ciliar dos rios há o empobrecimento da equitiofauna.
‒ “Seria exaustivo ‒ pondera o sr. Agenor Couto de Magalhães ‒ enumerar em um só artigo de jornal todos os problemas cruciais que afligem a nossa imaginação e tambem o nosso entranhado amor pelas coisas do Brasil.”
Fazendo referencias aos tão combatidos despejos toxicos nas aguas dos nossos rios e lagos, disse o presidente da Sociedade Geografica Brasileira, que são tambem deses flagelos que exigem uma pronta correção. O rio Tietê, o Piracicaba, e o Mogi-Guaçu, lembra, estão sendo poluidos por substâncias altamente nocivas à vida dos peixes e se, em futuro proximo, não se cuidar do tratamento desses residuos os peixes finos que demandam essas grandes caudais fluviais desaparecerão por completo, cabendo principalmente, nesse caso, ao governo baixar instruções severas junto as prefeituras para que essas fabricas e usinas antes de terem as suas planta aprovadas apresentem os projetos para o tratamento de seus despejos residuais.
A QUEIMA DOS CAMPOS
‒ “Outro aspecto da questão que precisa ser ventilado ‒ diz-nos ‒ é a queima dos campos e invernadas exatamente no mês em que há a anidrificação e postura das especies campesinas (agosto e setembro), sendo necessario, então, que se façam essas queimadas por um sistema rotativo, isto é, queimar campos em varios setores alternadamente.
Como sabemos, a queima dos campos é necessaria para renovar a pastagem verde imprescindivel à pecuaria.”
PEQUENA A AREA REFLORESTADA
Respondendo a uma pergunta do reporter afirmou o sr. Agenor Couto de Magalhães que é ainda relativamente pequena a nossa area reflorestada comparada com aquilo que se destruiu. O maior reflorestamente, prossegue, é o da Paulista em Rio Claro, Jundiaí e Loreto, reflorestamento esse muito interessante do ponto de vista comercial mas absolutamente condenavel do ponto de vista biologico, pois sabemos que o eucalipto não produz frutos e não abriga a nossa onix, e tambem não permite, como é feita a sua platanção, a vegetação intermediaria. Até agora foram plantados no Estado mais de 3 milhões de pés de eucaliptos.
Recomendou o nosso entrevistado entre as arvores que substituirão com vantagem o eucalipto, na recomposição das matas primitivas as varias especies das caneleiras, o cedro, o jacaré, as acacias e outras mais.
O FUTURO SAARA CABOCLO
Fez menção o sr. Couto de Magalhães às nossas grandes zonas que estão sendo completamente devastadas, como a Sorocabana, e a Noroeste de Bauru, de Juquiá às barrancas do rio Paraná, que está fadada a ser um novo Saara, uma vez que é constituida de terra excessivamente arenosa.
O CODIGO FLORESTAL
Como na Camara Federal, existe um projeto de elaboração do Codigo Florestal, perguntamos ao nosso entrevistado sobre o mesmo e tivemos a seguinte resposta:
‒ “O Codigo Florestal resolveria em parte a devastação das matas. Contudo, permite que se derrube uma parte daquilo que se adquire, numa proporção de 70% e, consequentemente o lavrador ficará sempre com uma parte da sua propriedade enriquecidade com um testemunho florestado daquilo que existia nessas terras.”
POLICIAMENTO
Sobre a fiscalização das infrações praticadas contra o Codigo Florestal, esclareceu-nos o sr. Agenor Couto de Magalhães que aquele Codigo outorga, a todos aqueles que tenham uma parcela de autoridade, a desempenhar as funções de fiscais florestais. Só assim, salienta, será possivel existir uma policia capaz de denunciar os crimes que frequentemente são cometidos contra o nosso patrimonio nacional.
Jornal de Noticias, São Paulo, 22 de janeiro de 1950
Fonte: Hemeroteca Digital Brasileira